1.
Um livro é um livro?
1.1
- A perspectiva do autor.
O autor gera, e é em si, a matéria-prima em
bruto na cadeia da edição. É o centro deste universo e propulsiona-o, sendo
simultaneamente a sua razão de ser. Descendente de Prometeu, roubou aos deuses
o seu papel, com altivez. O autor é a força criadora, primordial, pura. É a génese.
Motivado pelo temperamento, pela paixão, pelo
intelecto, o que o move é a necessidade humana de comunicar, de partilhar, e
talvez a vaidade de o fazer com destreza e génio. O ego pode turvar-lhe o
entendimento, o diagnóstico da sua própria qualidade e pertinência. É muitas
vezes autista perante as necessidades da máquina que o alimenta (as
necessidades do seu tempo, dos seus contemporâneos, dos parceiros e membros da
cadeia de edição).
Tomado pela arrogância
do criador, está habituado a reconstruir o mundo à sua imagem, e alimenta
expectativas irreais.
O autor ou recicla o mundo ou encontra uma
linguagem própria, original. Ou um mediante o outro.
É também um frontman, dá a cara, vende o seu
produto, é um agente de marketing de si próprio e da sua criação.
No romantismo era o
génio, carregava o peso do mundo sozinho, no modernismo era o emissário dos
homens e inventava a linguagem com que trazia, pilhada para os demais, a quinta
essência do mundo.
Sepultado por Roland Barthes; comprimido por
Michel Foucalt; na era de glória do hipertexto a sua criação corre o risco de
se ver brutalizada, mal circule pelas autoestradas da WEB. É um Dr.
Frankenstein involuntário. Só o editor o pode salvar, enquadrando-o,
mostrando-lhe um caminho, dando-lhe abrigo e protegendo-o do mundo.
1.2
- A perspectiva do editor.
O editor é sempre um co-autor, porque manipula
o nascimento, a forma e o sentido do texto. Lê o mundo e antecipa tendências.
Prevê os cataclismos e as oportunidades nas suas antecâmaras.
Se o autor é o homem, o génio humano, o editor
é um deus: antevê a necessidade de criar o autor, cria-o e finalmente orienta-o.
Mostra-lhe o caminho que antecipadamente rasgou para ele. Se o autor pode
plantar e colher, significa que previamente o editor localizou o terreno, abriu
condutas, drenou os pântanos.
O editor protege o autor. Tem o sentido
paternal obrigatoriamente perverso de ter de, ora refrear o seu ego, ora
inflamá-lo.
É a ponte que liga a humanidade ao génio, e
que liga o mundo dos interesses, o mundo prosaico, fútil, ao mundo do sublime,
do espiritual. É um homem do renascimento: domina o marketing e a gestão, o
design e as belas artes, as artes clássicas como a retórica, é um oráculo do
seu tempo, e sabe de física, poesia, história, literatura e cinema.
É omnisciente e omnipresente, mas quando o
pano sobe o público não o vê, porque o seu trabalho é na sombra, no meio da
mesma escuridão de onde saiu o tempo e a matéria.
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